NOTAS SOLTAS E RUÍDOS ESCRITOS

domingo, 11 de abril de 2010

Sergio Mendes - Bom tempo para o maestro

Aos 69 anos, Sérgio Mendes pode ser considerado o músico brasileiro em atividade com maior prestígio no exterior – e mais precisamente no mercado americano. Radicado nos Estados Unidos desde meados dos anos 60, o maestro, como é conhecido desde então na América do Norte, pegou carona na explosão bossanovista capitaneada pela santíssima trindade Tom, Vinicius e João, ganhou Grammy, encabeçou paradas de sucesso, apresentou-se em estádios, cerimônias do Oscar e em plena Casa Branca para os presidentes Lyndon Johnson e Richard Nixon. Fez de tudo para se tornar um dos baluartes da brazilian music mundo afora. Conseguiu. E agora celebra quase cinco décadas de carreira com o lançamento do álbum Bom tempo, seu 36º.

– Tudo começou com Stan Getz e Charlie Byrd com Astrud e João Gilberto tocando as músicas do Tom. Foi um dos mentores e um amigo – relembra Mendes, pelo telefone de sua casa em Los Angeles. – Depois veio o meu trabalho com Cannonball Adderley e Ron Carter, mais tarde Frank Sinatra e Ella Fitzgerald gravando com Jobim, David Byrne fazendo discos com músicos brasileiros, até chegarmos nos meus últimos trabalhos, Timeless e Encanto que atraíram uma série de jovens músicos americanos que amam a nossa música.

Como se sabe, o reconhecimento e a fama não são de agora, apesar de o músico ter tido sua importância reforçada a partir de meados dos anos 2000. Produzido em parceria com Will.I.ame lançado após hiato de uma década, Timeless (2006) redimensionou a grife Sergio Mendes, trajou com nova roupagem suas criações, reacendeu a carreira, renovou seu público e reapresentou as particularidades rítmicas e melódicas da música popular brasileira para milhões de jovens americanos – em sua maioria fãs dos maiores astros do pop e do hip hop americano. Isso porque, na ocasião, Mendes fora surpreendido com um convite feito pelo famoso produtor e líder do grupo pop Black Eyed Peas. Ao bater em sua porta, o americano carregava na memória os arranjos de Mendes e, debaixo do braço, uma coleção de vinis recheada por clássicos como Brasil'65, Sergio Mendes & Brasil'66, Equinox, entre outras gemas das décadas de 60 e 70.

– Timeless foi realmente um diviso de águas. A primeira surpresa foi descobrir que Will tinha todos os meus discos. Ele cresceu escutando o meu trabalho e nos tornamos bons amigos – diz. – Foi a partir dele que descobri que existia uma nova geração de artistas americanos que havia absorvido a minha música lá atrás. Foi muito importante descobrir esse interesse. E foi desse encontro que nasceu Timeless. Não foi nada programado, coordenado por gravadora, ou coisa parecida... Simplesmente uma porção de gente queria fazer parte do disco.

Uma porção de peso: de Will.I.am e sua parceira Fergie a astros pop como Justin Timberlake, John Legend, Erykah Badu e Black Thought, passando por antigos amigos como Stevie Wonder e recentes como Marcelo D2. A salada tropical contemporânea azeitada por Will e Mendes embalava o samba, a bossa nova e o flerte com o jazz sob as bases sintéticas do hip hop e do r&b. Puxado pela releitura de Mas que nada, o disco emplacou e moldou a estética que o artista seguiu em Encanto e que repete em Bom tempo, apesar de agora dar preferência a participação de mais artistas brasileiros, como Milton Nascimento, Carlinhos Brown e Seu Jorge.

– Depois desses dois discos notei uma grande renovação do meu público. A partir deles muita gente começou a redescobrir Brasil'66 e outros – explica. – Agora faço um disco mais brasileiro, recheado com artistas do Brasil. Alguns amigos de longa data, como o Milton e Carlinhos, que foi um dos grandes responsáveis por Brasileiro (1992). É um disco para cima, até porque foram grandes momentos.

Apesar de poucas visitas ao país, sendo a última há dois anos, Mendes tenta manter-se minimamente atento à produção musical nacional. E foi através de amigos que conheceu o trabalho e entrou em contato com Seu Jorge.

– Consegui entrar em contato com o Seu Jorge através do Mario Caldato – conta Mendes, referindo-se ao produtor brasileiro responsável por discos de artistas como Beastie Boys. – Gostei muito da voz dele e o convidei para duas canções. Recebo e compro discos, então estou sempre de olho no que as pessoas estão fazendo no Brasil.

Seu Jorge empresta seu vozeirão para canções escolhidas a dedo pelo arranjador, Maracatu atômico e Maracatu, nação do amor, de Moacir Santos.

– Eu tenho boas lembranças com Moacir por essa música. Toco ela desde quando tinha 17 anos e morava em Niterói – recorda. – Foi bonito ter o seu Jorge e a Gracinha (Leporace, sua mulher) nesta versão. Foi como o encontro com Marcelo D2, que faz uma música brasileira super contemporânea. Gosto de apostar em novos artistas, porque sempre dão uma energia extra ao disco.

O artista, que fez de sua discografia um mosaico contemporâneo, mesclando clássicos de Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Baden Powell, João Donato, Jorge Ben com versões para pérolas dos Beatles, Cole Porter, Michel Legrand, Burt Bacharach, entre outros, segue recriando peças marcantes do cancioneiro nacional. Aberto com Emorio, de João Donato, Bom tempo navega por releituras de peças consagradas do cancioneiro brasileiro, como Caminhos cruzados, Só tinha de ser com você e País tropical, além de uma nova versão para The real thing, escrita por Stevie Wonder especialmente para Mendes, para o álbum Sergio Mendes and the New Brasil '77; e a gravação de Caxanga, com a participação de Milton Nascimento.

– As participações foram incríveis. Brown é um percussionista sensacional. Tenho uma admiração enorme pelo trabalho dele e por isso o chamei novamente. Já Milton me fez uma surpresa. Depois de aceitar o convite ele veio com a ideia de fazer Caxanga, uma canção lindíssima que eu não me lembrava. A música tem um perfume especial, como tudo o que ele faz. Gostaria muito de voltar a tocar no Brasil. Quem sabe numa turnê com Brown, Milton, Seu Jorge... Só falta o convite.

Nenhum comentário: