NOTAS SOLTAS E RUÍDOS ESCRITOS

domingo, 4 de abril de 2010

Phantogram - Do bucolismo rural ao caos da metrópole

Ao contrário do que parece, não é só do Brooklyn que explode a mais excitante produção musical do cenário americano. Entre os poucos mais de 20 mil habitantes da remota Saratoga Springs, cidade interiorana ao norte de Nova York, Sarah D. Barthel (voz e piano) e Joshua M. Carter (guitarra) – o duo Phantogram – catapultam um trabalho que une a placidez ao caos. Como se uma ponte de notas abolisse os quilômetros e as diferenças atmosféricas que separam a cosmopolita metrópole do recanto rural. Entre o trepidar veloz e crispado de beats eletrônicos, melodias fluidas e vocais enevoados, Eyelid movies, debute recém-lançado pela dupla, ressoa cada vez mais intenso nos centros urbanos dos EUA. Incensado pela crítica, assim como por artistas de destaque do cenário alternativo, como o Yeasayer, o grupo assina um trabalho cruzado por referências modernas e clássicas, mas que constitui uma paisagem sonora predominantemente futurista.

– Ainda estamos aprendendo a lidar com essa resposta, assimilando a ideia de que as pessoas estejam realmente curtindo o nosso trabalho depois de tanto tempo de experimentações. Fico ansioso porque temos muito mais trabalho para fazer e canções novas para mostrar – revela Carter.

Beats produzidos na fazenda
Antes do primeiro registro oficial e do contrato assinado com o selo Barsuk, o guitarrista transformou o celeiro da fazenda de seus pais num laboratório. Sentado ao piano, empunhado sua guitarra ou colado à tela do computador pilotando traquitanas diversas, trabalhou por três anos ininterruptos na construção de beats eletrônicos, linhas de bateria e guitarra, experimentando texturas e timbres inusitados. Após uma tentativa de carreira frustrada em Nova York, ele retornou ao interior e decidiu que era hora de avançar, a princípio sozinho.

– Quando voltei a Saratoga mergulhei em milhões de testes. Não que eu quisesse ser um artista solo, mas era o meio que eu tinha encontrado no momento – revela.

O isolamento, porém, durou pouco. Em poucos meses, Sarah regressava da universidade. Pianista e dona de um timbre vocal peculiar, não tardou até que as afinidades musicais se transformassem em canções.

– Começamos a sair juntos e decidi mostrar algumas coisas que eu vinha trabalhando – conta. – Eu sabia que ela tinha uma voz incrível e que tocava algumas coisas bem legais no piano. Ela aceitou colocar uns vocais numa música e ficou muito bom... Acho que a partir daí entendemos que estávamos começando uma banda. De lá para cá foi tudo muito rápido. As pessoas em Nova York começaram a falar sobre a gente. E agora é uma bola de neve.

Eyelid movies avança sobre a música neoclássica, krautrock, shoegaze, afro beat e uma porção de referências. Aliás, ao contrário de 9 entre 10 artistas, Carter faz questão de enumerar dezenas de músicos, artistas, produtores e cantores que fazem a sua cabeça e o ajudaram a esculpir a sonoridade entrecruzada do grupo.

– Nunca pensei na ideia de seguir um determinando gênero. O que importa é sugar o que é bom das vertentes mais diferentes, desde os Beatles ao My Bloody Valentine, do Sonic Youth ao Madlib – exemplifica. – Para ter uma ideia, quando eu era criança era fascinado por hip hop, Public Enemy e Beastie Boys. No fim da adolescência mergulhei em Pavement, Smashing Pumpkins, Beck, Nirvana... Acho que agora deixamos um pouco de lado essas influências. Temos escutado J. Dilla, David Bowie, Curtis Mayfield, Sparklehorse, Joy Division, Serge Gainsbourg, Flying Lotus.

Produzido pela dupla, entre 2007 e 2008, o disco foi construído sem pressa, ao longo de inúmeras sessões na fazenda do guitarrista.

– Ficávamos tocando horas e horas em cima daquelas bases, testando melodias e ideias. Era um quebra-cabeça fazer daquilo algo real, que pudesse ser tocado ao vivo. Apesar de também criarmos sozinhos, acho que as nossas canções preferidas são as que fizemos juntos. Foram feitas num estalo, fluíram naturalmente.

Mesclando sonoridades eletrônicas e orgânicas, o que se houve em faixas como Mouthful of diamonds, When I'm small, You are the ocean, entre outras, é uma atmosfera borrada e furtiva característica do dream pop. Mais do que criar sentidos bem definidos em seus versos, as canções assinadas pela dupla tencionam apagar a linha que separa o sonho da realidade, “aquele estágio inebriado logo que acordamos”, define. No álbum, isolamento e solidão dividem forças com momentos menos acinzentados, em que a banda visita referências mais dançantes e injeta colorido aos arranjos a partir de samples pinçados da black music. Entre o abstrato e o concreto, o Phantogram estrutura melodias suaves a partir de batidas secas e precisas.

– O nosso objetivo sempre foi criar um tipo de canção que gostaríamos de ouvir. Algo fresco e familiar, que pudesse inspirar as pessoas – diz. – Tenho uma imagem que ilustra bem o que fazemos. Imagino fios e alto-falantes surgindo em meio a sujeira e brotando como flores.

Em versos, arranjos e visualizações repletas de ideias opostas, elegem uma dualidade atemporal como elemento temático e sonoro central: o jogo entre a vida e a morte, intermediado pelo amor.

– Seria difícil escrever sobre qualquer outra coisa, porque é o que desperta a nossa sensibilidade. Existe uma carga emotiva e de honestidade muito forte nas nossas letras, mas mesmo assim acho que é um disco gostoso para se ouvir com fones ou durante uma viagem de carro pela estrada.

Veja essa: Mouthful of diamonds




E mais aqui: http://www.myspace.com/phantogram

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