Filho do mestre do violão, Baden Powell, Marcel Powell, 25 anos, não se esconde atrás de um dos sobrenomes mais imponentes da MPB. Dedicado ao mesmo instrumento que seu pai, ao lado de João Gilberto, redimensionou a forma de tocar, ele planeja para esse ano o lançamento do seu segundo álbum solo, 'Cobra viva', definido pelo próprio como um álbum de música instrumental braisleira.
Ao beber de fontes diversas e não apenas da bossa nova, que Baden e João talharam em conjunto com Vinícius de Moraes e Tom Jobim, ele lança mão de um repertório de choro, frevo, baião, entre outros ritmos, e se nega a incumbência de renovar ou modernizar o gênero musical que consagrou sua linhagem familiar.
Indicado ao prêmio TIM de música e ganhador do prêmio Rival Petrobrás na categoria melhor instrumental solo, em 2006, pelo disco 'Aperto de mão', Marcel conta que já tem gravada a metade do novo álbum, que traz releituras de Lenine, Gilberto Gil, João Bosco, além de inéditas de seu pai e composições próprias.
Ciente de que a bossa nova é parte fundamental de sua história, justamente pela importância de seu pai para o gênero, Marcel lembra que Baden era um artista que flertava com diversos outros gêneros, e, que, como professor, sempre o incentivou a experimentar os ritmos que hoje afirmam sua posição de músico contemporâneo, com o radar ligado para novas idéias.
Nesta entrevista, ele faz questão de pôr em xeque o mito que credita à música instrumental uma complexidade que impede, ou dificulta, sua absorção por um grande número de ouvintes. Defensor do lema: "música boa é música boa", independentemente de gêneros, o violonista espera que mais veículos de comunicação possam apresentar a música instrumental como fruto do mesmo universo da MPB e, não, como um estilo segmentado e que necessita de tratamento especial.
LFR: Até que ponto a bossa nova é a base de sua formação musical e de suas experimentações artísticas atuais?
LFR: Até que ponto a bossa nova é a base de sua formação musical e de suas experimentações artísticas atuais?
MP: Não posso dizer que a bossa nova é minha principal influência, já que diversos outros gêneros e ritmos que compõem a música brasileira fizeram parte da minha formação, caso do choro, frevo, baião. O choro, sim, talvez possa dizer que é a base da música brasileira. Me considero um artista de música instrumental brasileira e nos meus shows nunca faltam choros.
LFR: Essa mistura com outros ritmos brasileiros, no entanto, que formam o cerne de sua musicalidade?
MP: É lógico que a bossa nova é parte fundamental da minha história, justamente pelo o que meu pai representa para a nossa música. Mas ao mesmo tempo ele era um artista independente da bossa nova e flertava com diversos outros gêneros. Como foi ele quem me ensinou música, essa noção e interesse por outros ritmos foi repassada naturalmente. Não tenho como destacar apenas a bossa nova, mesmo sendo óbvio afirmar que ela tem uma importância significativa na formação de cada músico brasileiro.
LFR: Se comparados a outros gêneros, não são muitos os artistas contemporâneos que apostam na bossa nova. Acredita que o gênero carece de renovação?
MP: Também toco bossa nova, mas não creio que seja uma renovação do estilo, mas, sim, outra coisa, algo novo e diferente. Deixo a bossa nova para os artistas do gênero que ainda estão aí, como o Carlos Lyra. Existem muitos artistas influenciados pela bossa nova, esta é a forma que ela vive, hoje. Grupos como Bossa Cuca Nova, o trio Jobim, que gravou CD com Milton Nascimento, assim como Kay Lyra, filha do Carlos, que tem um trabalho voltado para a bossa nova. Já o meu trabalho não é somente isso. Estou sempre a procura de novas referências. Além disso, o meu trabalho é totalmente instrumental, gênero que, brevemente analisado, valoriza o talento da pessoa que toca, o instrumentista. Enquanto a bossa nova valoriza mais a canção, a letra e a melodia, uma música cantada.
LFR: Como vê a construção do mito de que a música instrumental é complexa demais para a absorção ou apreciação de um número grande de pessoas?
MP: Acho que música boa é música boa. Isso não tem relação com um ou outro gênero. Acho que por ser uma música de mais qualidade, mais sofisticada, muitas gravadoras acabam tendo medo de apostar. Acaba que o instrumental se torna algo mais seleto, não pela questão do poder aquisitivo de quem a consome, mas muito pela idéia de que o ouvinte de música instrumental é alguém que seleciona e busca o que quer ouvir e, não, como o ouvinte comum que é obrigado, queira ele ou não, a ouvir o que toca nas rádios.
LFR: O estilo sofre, no entanto, com a segmentação, como vê a questão das rádios? Por que não escutamos música instrumental normalmente inserida na programação das FMs dedicadas à canção brasileira?
MP: Muita gente fica impossibilitada de ter acesso à música instrumental. Isso restringe um número grande de pessoas que não têm a oportunidade de saber se aquele som os agrada ou não. Acho que os discos e os shows tem que ser mais baratos, mas as rádios poderiam incluir normalmente e sem medo a música instrumental. Acho que a MPB FM, por exemplo, que eu particularmente adoro, poderia colocar música instrumental ao longo da programação. Egberto Gismonti poderia tocar ao lado de Maria Rita, ou Lenine, e, não só em um programa especializado. Não há porque segmentar, faz parte da nossa cultura. Não é preciso demarcar o território.
LFR: Em 2006, você foi indicado ao prêmio TIM de música e ganhou o prêmio Rival Petrobrás na categoria melhor instrumental solo, pelo disco 'Aperto de mão'. Agora prepara um novo álbum, como será este trabalho?
MP: Algumas canções serão registradas em trio e quarteto. Outras recebem tratamento de violão solo. Serão quatro músicas de minha autoria e duas inéditas do meu pai. 'Chora violão', canção composta em homenagem a Raphael Rabello, e 'Abraço no trio elétrico', em homenagem ao bandolinista Armandinho. De João Bosco, regravo 'Incompatibilidade de gênios' e 'Bala com bala'; de Lenine, 'O dia em que faremos contato'; de Gil e Dominguinhos, 'Lamento sertanejo'; além de uma canção do Sivuca.
LFR: Essa mistura com outros ritmos brasileiros, no entanto, que formam o cerne de sua musicalidade?
MP: É lógico que a bossa nova é parte fundamental da minha história, justamente pelo o que meu pai representa para a nossa música. Mas ao mesmo tempo ele era um artista independente da bossa nova e flertava com diversos outros gêneros. Como foi ele quem me ensinou música, essa noção e interesse por outros ritmos foi repassada naturalmente. Não tenho como destacar apenas a bossa nova, mesmo sendo óbvio afirmar que ela tem uma importância significativa na formação de cada músico brasileiro.
LFR: Se comparados a outros gêneros, não são muitos os artistas contemporâneos que apostam na bossa nova. Acredita que o gênero carece de renovação?
MP: Também toco bossa nova, mas não creio que seja uma renovação do estilo, mas, sim, outra coisa, algo novo e diferente. Deixo a bossa nova para os artistas do gênero que ainda estão aí, como o Carlos Lyra. Existem muitos artistas influenciados pela bossa nova, esta é a forma que ela vive, hoje. Grupos como Bossa Cuca Nova, o trio Jobim, que gravou CD com Milton Nascimento, assim como Kay Lyra, filha do Carlos, que tem um trabalho voltado para a bossa nova. Já o meu trabalho não é somente isso. Estou sempre a procura de novas referências. Além disso, o meu trabalho é totalmente instrumental, gênero que, brevemente analisado, valoriza o talento da pessoa que toca, o instrumentista. Enquanto a bossa nova valoriza mais a canção, a letra e a melodia, uma música cantada.
LFR: Como vê a construção do mito de que a música instrumental é complexa demais para a absorção ou apreciação de um número grande de pessoas?
MP: Acho que música boa é música boa. Isso não tem relação com um ou outro gênero. Acho que por ser uma música de mais qualidade, mais sofisticada, muitas gravadoras acabam tendo medo de apostar. Acaba que o instrumental se torna algo mais seleto, não pela questão do poder aquisitivo de quem a consome, mas muito pela idéia de que o ouvinte de música instrumental é alguém que seleciona e busca o que quer ouvir e, não, como o ouvinte comum que é obrigado, queira ele ou não, a ouvir o que toca nas rádios.
LFR: O estilo sofre, no entanto, com a segmentação, como vê a questão das rádios? Por que não escutamos música instrumental normalmente inserida na programação das FMs dedicadas à canção brasileira?
MP: Muita gente fica impossibilitada de ter acesso à música instrumental. Isso restringe um número grande de pessoas que não têm a oportunidade de saber se aquele som os agrada ou não. Acho que os discos e os shows tem que ser mais baratos, mas as rádios poderiam incluir normalmente e sem medo a música instrumental. Acho que a MPB FM, por exemplo, que eu particularmente adoro, poderia colocar música instrumental ao longo da programação. Egberto Gismonti poderia tocar ao lado de Maria Rita, ou Lenine, e, não só em um programa especializado. Não há porque segmentar, faz parte da nossa cultura. Não é preciso demarcar o território.
LFR: Em 2006, você foi indicado ao prêmio TIM de música e ganhou o prêmio Rival Petrobrás na categoria melhor instrumental solo, pelo disco 'Aperto de mão'. Agora prepara um novo álbum, como será este trabalho?
MP: Algumas canções serão registradas em trio e quarteto. Outras recebem tratamento de violão solo. Serão quatro músicas de minha autoria e duas inéditas do meu pai. 'Chora violão', canção composta em homenagem a Raphael Rabello, e 'Abraço no trio elétrico', em homenagem ao bandolinista Armandinho. De João Bosco, regravo 'Incompatibilidade de gênios' e 'Bala com bala'; de Lenine, 'O dia em que faremos contato'; de Gil e Dominguinhos, 'Lamento sertanejo'; além de uma canção do Sivuca.
LFR: Será lançado apenas no Brasil?
MP: Por enquanto, sim. Mas espero lançá-lo internacionalmente, assim como fiz com meus outros discos. Faço muita coisa lá fora, eles têm muito interesse pela nossa música.
LFR: Você se considera mais um compositor, ou realmente um instrumentista que se dedica à interpretação e releitura de músicas?
MP: Apesar de criar e formar estas parcerias, eu me dedico mais a interpretação e ao instrumento. Não tenho a pretensão de ser um compositor, como foi meu pai. Ele conseguiu conciliar suas duas aptidões. Sei que não há regras, tanto que no meu trabalho solo componho e gravo alguns dos meus temas. Mas por enquanto me vejo como instrumentista.
LFR: Existem parceiros que colocam letras em suas músicas?
MP: Tenho canções em parceria com o Paulo César Pinheiro, com o Diogo Nogueira, entre outros. São sambas com letras, mas ainda não foram gravados. Talvez a Mariana Leporace grave alguma destas canções em um novo trabalho dela.
LFR: Como era Baden Powell como professor? Reza a lenda de que era extremamente rígido. Como lidava com essa pressão nos ensinamentos? Pensou em seguir outra carreira?
MP: De jeito nenhum. Queria ser músico desde pequeno. Ele foi meu único professor, mas foi o professor. Ele realmente era severo, mas não impôs que eu e meu irmão nos dedicássemos à música. Comecei mais ou menos como ele, que roubou seu primeiro violão de uma tia, ao invés de pedir emprestado, por timidez. Eu, no caso, roubei o instrumento do meu irmão e fui pedir aulas ao meu pai. Não houve obrigação, mas, como fui procurá-lo, ele deixou claro, desde o início, que eu teria que aprender a tocá-lo direito. Ele era um cara muito claro e se eu ou meu irmão não levássemos jeito para a coisa ele teria sido o primeiro a impedir uma exposição sem preparo da nossa parte.
LFR: Como lida com a cobrança dos apreciadores, ou críticos, da música do seu pai em relação ao fato de ser o filho de Baden Powell? O que há de bom e de ruim nisso?
MP: Qual é o jogador que não quer se comparado, ou gostaria de ser filho do Pelé? Isso sempre me abriu portas, mas manter essa posição depende exclusivamente da minha performance. Afinal, você pode ter tudo, ser o filho do Baden Powell, ter talento, mas o estudo e a dedicação são fundamentais. Além disso, as pessoas querem te ouvir, saber como você toca, o que tem para mostrar. Comecei aos 9 anos e meu pai marcava em cima. Só deixava uma peça de lado quando ela já poderia ser bem tocada. Ainda estudo muito, no mínimo três horas por dia, as vezes chega a cinco ou seis horas de treino. Mas é lógico que tem dias em que eu descanso, também.
MP: Apesar de criar e formar estas parcerias, eu me dedico mais a interpretação e ao instrumento. Não tenho a pretensão de ser um compositor, como foi meu pai. Ele conseguiu conciliar suas duas aptidões. Sei que não há regras, tanto que no meu trabalho solo componho e gravo alguns dos meus temas. Mas por enquanto me vejo como instrumentista.
LFR: Existem parceiros que colocam letras em suas músicas?
MP: Tenho canções em parceria com o Paulo César Pinheiro, com o Diogo Nogueira, entre outros. São sambas com letras, mas ainda não foram gravados. Talvez a Mariana Leporace grave alguma destas canções em um novo trabalho dela.
LFR: Como era Baden Powell como professor? Reza a lenda de que era extremamente rígido. Como lidava com essa pressão nos ensinamentos? Pensou em seguir outra carreira?
MP: De jeito nenhum. Queria ser músico desde pequeno. Ele foi meu único professor, mas foi o professor. Ele realmente era severo, mas não impôs que eu e meu irmão nos dedicássemos à música. Comecei mais ou menos como ele, que roubou seu primeiro violão de uma tia, ao invés de pedir emprestado, por timidez. Eu, no caso, roubei o instrumento do meu irmão e fui pedir aulas ao meu pai. Não houve obrigação, mas, como fui procurá-lo, ele deixou claro, desde o início, que eu teria que aprender a tocá-lo direito. Ele era um cara muito claro e se eu ou meu irmão não levássemos jeito para a coisa ele teria sido o primeiro a impedir uma exposição sem preparo da nossa parte.
LFR: Como lida com a cobrança dos apreciadores, ou críticos, da música do seu pai em relação ao fato de ser o filho de Baden Powell? O que há de bom e de ruim nisso?
MP: Qual é o jogador que não quer se comparado, ou gostaria de ser filho do Pelé? Isso sempre me abriu portas, mas manter essa posição depende exclusivamente da minha performance. Afinal, você pode ter tudo, ser o filho do Baden Powell, ter talento, mas o estudo e a dedicação são fundamentais. Além disso, as pessoas querem te ouvir, saber como você toca, o que tem para mostrar. Comecei aos 9 anos e meu pai marcava em cima. Só deixava uma peça de lado quando ela já poderia ser bem tocada. Ainda estudo muito, no mínimo três horas por dia, as vezes chega a cinco ou seis horas de treino. Mas é lógico que tem dias em que eu descanso, também.
LFR: O que o seu violão e a sua arte tem de Baden Powell, o que você reconhece como herança? O que tem de Marcel, que elementos originais você incorpora nessa história?
MP: Do meu pai tem bastante coisa. É ímpossível não carregar esses traços. Ele foi meu pai e professor. Se os músicos, normalmente, já carregam essa herança dos professores, comigo essa relação era ainda mais forte. Mas tento imprimir minha marca e procuro gravar canções que ele não tenha tocado ou gravado, para que as pessoas não fiquem imaginando ou comparando versões. Da minha parte, trago essa coisa da velocidade, de tocar as escalas de forma rápida, algo que ele não fazia tanto. Como compositor, ele se apegava muito às questões melódicas. Empregava a técnica de forma diferente.
MP: Do meu pai tem bastante coisa. É ímpossível não carregar esses traços. Ele foi meu pai e professor. Se os músicos, normalmente, já carregam essa herança dos professores, comigo essa relação era ainda mais forte. Mas tento imprimir minha marca e procuro gravar canções que ele não tenha tocado ou gravado, para que as pessoas não fiquem imaginando ou comparando versões. Da minha parte, trago essa coisa da velocidade, de tocar as escalas de forma rápida, algo que ele não fazia tanto. Como compositor, ele se apegava muito às questões melódicas. Empregava a técnica de forma diferente.
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