NOTAS SOLTAS E RUÍDOS ESCRITOS

domingo, 25 de maio de 2008

Hermeto e Lapidusas


Há cerca de cinco anos, antes mesmo de fixar residência no Rio de Janeiro, o pianista Pablo Lapidusas levou a sério a idéia de que a casa de Hermeto Pascoal, no bairro de Jabour, no subúrbio do Rio, era um estúdio aberto, e que bastava ao interessado em conhecê-lo bater no portão para ser recebido e iniciar, talvez, uma jam session com o mestre. Passados alguns anos, o argentino vê com orgulho a oportunidade de ter Hermeto o acompanhando em uma das faixas de seu primeiro álbum solo, Ouriço (Delira Música), lançado ontem, no Mistura Fina, em Ipanema.

No álbum, dez temas, sendo nove de autoria de Pablo, navegam entre o jazz, a música erudita e a bossa nova. Em "Ouriço", o músico conta ainda com a participação especial do soprista Carlos Malta, que apresenta uma releitura para a faixa "Choro nº 1", com arranjos que privilegiam flautas e saxofones em uma versão coreto, para 11 peças.

Radicado no Rio desde 2001, antes de se lançar em carreira solo, Pablo Lapidusas acompanhou shows e gravações de artistas renomados da MPB e da cena instrumental, como Sandra de Sá, Marcelo D2, Quarteto em Cy, Victor Biglione, entre outros.

LFR: Como estão sendo compostos estes seus primeiros shows de lançamento do álbum? Você já se apresentou na Fnac e ontem no Mistura...

PL: No meu show toco algumas canções do novo CD, assim como clássicos de Tom Jobim e Gershwin. Uma mescla, de jazz, bossa nova e música erudita, a partir de arranjos meus.

LFR: Como foi a seleção do repertório para Ouriço? Basicamente um álbum de composições próprias...

PL: O disco apresenta minhas primeiras composições. Tive a sorte de ter dois gênios tocando e me apoiando em duas delas, Carlos Malta e Hermeto Pascoal.

LFR: Como surgiu o contato com Hermeto?
PL: Sabia que as pessoas apareciam em sua casa para tocar e tomei coragem para realizar a tarefa. Fui recebido pelo filho dele, e pude avistar Hermeto com lápis na mão, trabalhando em uma de suas milhares de canções. Mostrei uma das minhas músicas, "Piripiri", e ele gostou. Desde o primeiro contato, ele foi generoso comigo e com o meu trabalho. Anos depois o convidei para a gravação do álbum. Ele se colocou ao nível dos mortais, aceitou o convite e tocou sua escaleta em "Piripiri".

LFR: Como foi gravar e conviver em estúdio com Hermeto?

PL: Me lembro que nos encontramos no estúdio e ele não sabia o que iria tocar. Muito menos se lembrava da música que eu havia lhe mostrado anos antes. Testou um teclado, mas não gostou e preferiu tocar sua escaleta. Decidiu o que iria fazer na música na hora, de improviso. Foi uma experiência impressionante, pois assim que toquei pela segunda vez o tema ele já havia fotografado a canção por inteiro. Sua musicalidade é realmente além do normal, pude presenciar sua força já no primeiro 'take'. Fiquei emocionado já com o seu primeiro solo, mas ele foi muito generoso e disse que queria gravar mais, pois tinha acabado de esquentar. Para mim já estava ótimo, mas a partir de então ele me deu diversas dicas sobre a música, fez algumas modificações e continuou criando e recriando sua parte.

LFR: E para escolher o melhor take, tarefa difícil?

PL: Era uma versão diferente da outra e ele não parava. Para escolher o take a ser usado foi um verdadeiro martírio. Optei pela espontaneidade da primeira tomada, que foi mágica. Apesar de ele ter se mexido muito enquanto gravavaestar se mexendo muito, o primeiro take foi magico, ele se mexia muito enquanto agvava, mas acabou valendo oprimeiro teria colocado, inspirada diferente, ele não tenta repetir abriu o radar dele vai aberir outras.

LFR: E a participação do Malta como foi?

PL: O Malta fez uma releitura de uma composição do álbum, Choro nº1, com arranjos para coreto, com 11 peças de sopro, entre elas saxofones e flautas. Ficou lindo e virou um bonus track.

LFR: Buscou referências de sonoridades em outros trabalhos de piano solo para explorar neste seu primeiro álbum?

PL: Queria fazer algo de piano solo e alguns discos do Brad Melhdau me tocaram bastante. Ele faz um jazz contemporâneo e intimista que me agrada muito. Apesar de ser um disco instrumental reservo espaço para três baladas, verdadeiras canções.

LFR: Apesar do jazz e da música erudita, há uma série de outros traços sonoros...

PL: Apostei em uma sonoridade quase camerística, apesar das influências de baião, choro, além da influência da música argentina (no caso, Astor Piazzola).

LFR: O que suas canções carregam da música argentina?

PL: A minha formação musical foi toda ouvindo música brasileira e jazz, mas com certeza Piazzolla também esta presente em minha música. De uns anos para cá me aproximei de sua obra. Obviamente já conhecia suas canções, mas passei a mergulhar fundo em seu repertório e redescobrir sua musicalidade que, até então, não sabia que era tão maravilhosa.

LFR: Piazzolla está presente nos seus shows?

PL: Ao contrário do que se pensa, a obra de Piazzola é muito conhecida no Brasil. Quando toco seus temas em meus shows a resposta é imediata. Piazzolla é referência não só para mim, como também no inconsciente coletivo dos brasileiros.

LFR: E do Brasil, quais são as influencias incorporadas ao seu trabalho?

PL: Minha inspiração vem de compositores e músicos como Egberto Gismonti, Chico Buarque e o próprio Edu Lobo, de quem regravei "Canto triste", única canção que não é de minha autoria a ser incluída no repertório do álbum. Se não uso estas influências na maneira de tocar, posso dizer que na maneira de compor e o resultado das minhas composições apresentam traços destes artistas.

LFR: Por que escolheu esta canção do Edu Lobo, que não é uma de suas mais conhecidas... O que ela tem de especial?

PL: Essa música era meio que um lado b do Edu. Quando pensei em regravar um autor brasileiro queria fugir do lugar comum. "Canto triste" não é um clássico dele, como é "Beatriz", por exemplo. A música brasileira é tão rica que existem muita coisa boa que não é executada e muitos desconhecem. É o caso desta canção, "Canto Triste".

LFR: Edu Lobo conhece a sua versão?

PL: Tive a oportunidade de mostrar a ele, que disse ter gostado bastante do resultado. Fiquei muito feliz.

Nenhum comentário: