NOTAS SOLTAS E RUÍDOS ESCRITOS

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Após 'Lula, o filho do Brasil', novos projetos abordam presidentes

Desde 1915, quando D.W. Griffith assinou O nascimento de uma nação, até 2011, quando Steven Spielberg leva às telas Lincoln – ambos tangenciam a figura de Abraham Lincoln (1809-1865) – uma infinidade de séries de TV, telefilmes, cinebiografias, longas de ficção (científica, dramas e ação) e até comédias elege como personagem central de suas tramas o chefe maior do estado americano. A enciclopédia virtual dos cinéfilos, o Internet Movie Database (IMDb) assegura – mais de 650 produções audiovisuais americanas renderam-se ao poder da Casa Branca. No Brasil, o cenário é o oposto. Em vias de mudança, o cinema político ainda encontra dificuldades. E com parcas produções, ainda se arrasta nas truncadas engrenagens de seu carro-chefe, Lula, o filho do Brasil, que completa um mês de circuito segunda-feira.

Exibido em mais de 350 salas espalhadas pelo país, até a última semana o longa de Fábio Barreto contabilizou 767 mil espectadores, com renda acumulada de R$ 6,5 milhões. Maior sucesso da bilheteria da chamada retomada, Se eu fosse você 2 atraiu 560 mil espectadores na semana de abertura, enquanto o longa de Barreto sobre a trajetória do atual presidente acumulou pouco mais de 100 mil espectadores – menos até que um de seus inspiradores, 2 filhos de Francisco (2005), com 266 mil espectadores na primeira semana.

Com tais rendimentos confrontados à média arrecadada por outras produções nacionais, não se pode dizer que os números sinalizem um fracasso. Porém, projetado e embalado como um blockbuster, a decepção não deixa de ser evidente. Antes de chegar às telas, o produtor Luiz Carlos Barreto projetava público de 5 milhões de espectadores para o longa.

Mesmo com as incertezas do mercado cinematográfico – e as dúvidas sobre a aceitação do público em relação ao tema – o “gênero” tenta decolar e já enquadra para os próximos meses produções envolvendo nomes como Getúlio Vargas, Jânio Quadros, Tancredo Neves, Fernando Collor e Fernado Henrique Cardoso. Autor de novelas, o roteirista Lauro César Muniz é o piloto de um dos mais ambiciosos projetos envolvendo cinema e política. De suas mãos nasce, até 2011, um longa dedicado a Getúlio Vargas. Como mote, cerca-se das três semanas que antecedem o suicídio que mitificou a figura do presidente a partir do fatídico 24 de agosto de 1954. Muniz acaba de entregar ao produtor Daniel Filho um primeiro tratamento para Dr. Getúlio (título provisório).

– Ficamos muito afastados do tema por causa da ditadura. Existia um grupo de cineastas, assim como outros artistas, impossibilitados de tocar no assunto. Foram quase 30 anos de silêncio. Agora ocorre uma euforia em torno do filme do Lula, um personagem super popular. E isso estimula os produtores a pensar em filmes do gênero – acredita Muniz. – Acho que os sete anos de governo Lula geraram um interessa cada vez maior da população sobre política. Ele foi sabiamente blindado de todos os escândalos envolvendo a corrupção.

O projeto do teledramaturgo parte do atentado ocorrido na Rua Tonelero (no qual morreu o major Rubem Vaz; o crime desencadeou os eventos que levariam ao suicídio de Vargas) e enfatiza as reações dos empregados do palácio do Catete e da população nos arredores do bairro.

“Suicídio foi um ato político”

– Não ficaremos presos à história real. Terá ficção. Getúlio foi um ditador, mas era uma personalidade fabulosa e sua história é uma tragédia nacional fantástica. Tudo o que acontece a partir do atentado até a sua morte é muito forte. Ele tornou-se um mártir. Seu suicídio foi um ato político.

Premiado pelos longas Jango (1984) e Os anos JK - Uma trajetória política (1980), o cineasta Silvio Tendler investe seus esforços em mais uma produção política, mas sob a embalagem do gênero documental. Há mais de 20 anos, ele acumula um arsenal de fitas de áudio e vídeos do ex-presidente Tancredo Neves. Tancredo, a travessia tem previsão de lançamento para abril de 2010 – mês que marca os 25 da morte da sua morte, em 1985. No registro, Tendler destrincha os bastidores da transição de poder e mostra que, de lá para cá, pouca coisa mudou.

– A política é um filão de cinema, e sempre esteve de braços cruzados com ele. Um dos maiores clássicos do cinema mundial é sobre um jornalista que se candidata à presidência, Cidadão Kane. No Brasil, o documentário que sempre namorou a política, enquanto a ficção tem problemas mais complexos com direito de imagens e pressão dos familiares – observa Tendler.

O documentarista acredita que houve um erro de avaliação no lançamento de Lula, o filho do Brasil.

– Acharam que cinema se induz à base de mídia, mas não é bem assim. Não adianta comprar com 2 filhos de Francisco, que é musical. Ainda assim, um público de 800 mil é muita gente, quase um milhão. Para o momento do cinema político brasileiro, é um bom resultado.

Se bem-sucedidas minisséries de TV, como JK (2006) e Agosto (1993) , despertaram a atenção de milhões de espectadores, o aparato cinematográfico apenas começa a erguer a grua sobre o filão. Exemplo recente, o diretor Zelito Viana não obteve êxito ao transportar para o cinema 24 horas de um dia de Juscelino Kubitschek. Bela noite para voar (2009) acumulou parcos 30 mil espectadores. Diretor do longa, Zelito Viana diz que a lacuna de filmes políticos se estende a outras searas, mas por um motivo comum:

– Falta dinheiro para fazer um filme sobre futebol e sobre personagens da cultura, como Carlos Gomes, por exemplo – compara Viana. – No campo político, não temos filmes sobre Getúlio e até Dom Pedro II, que é uma figura importantísima para o Brasil.

Irmão de Fábio Barreto, Bruno Barreto mira sua câmera na direção do ex-presidente Fernando Collor, num longa baseado no livro Notícias do Planalto (1999), do jornalista Mário Sérgio Conti. Oponente de Lula durante as eleições de 1989, Collor terá sua trajetória vasculhada, desde as ligações de seu avô Lindolfo Collor com Vargas até o impeachment que o tirou do poder, em 1992. Mais adiante, o diretor Paulo Filho busca viabilizar um longa sobre Jânio Quadros, enquanto que, para 2011, o documentário Rompendo o silêncio segue os passos de FHC.


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