NOTAS SOLTAS E RUÍDOS ESCRITOS

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Edu Krieger - Correnteza em mar seguro

Em seu primeiro trabalho solo, lançado há dois anos, o cantor, compositor e instrumentista Edu Krieger extraía de seu balaio o melhor de um repertório autoral talhado ao longo de anos dedicados a imersões criativas em muitos sambas, marchinhas e forrós, entre outros gêneros brasileiros enraizados em botecos espalhados pela Lapa.

Deixando-se levar pela mesma maré que conduziu sua primeira barca de canções, Krieger segue caminho estético similar nas 12 faixas que moldam Correnteza (Biscoito Fino), atracadas ao porto seguro de violões (de sete e oito cordas), cavaquinho, guitarra e percussão – e avança pouco.

A faixa-título e também abre-alas do seu novo álbum mostra o quanto o músico se banhou em linhagens melódicas e líricas que prestam tributo à fina estirpe de Paulinho da Viola – em especial, seus sambas que tratam do mar como inspiração, tanto pela fluidez melódica quanto pela atmosfera melancólica e contemplativa. Introduzida pelas graves notas de um sete cordas e pelo ressoar nostálgico de uma cuíca, a canção desliza por versos simples que clamam que a tal correnteza o leve, o mais depressa possível, ao encontro de um amor perdido ou distante.

Já nas faixas seguintes, Feira livre e, principalmente, Desestigma, Krieger acerta a caneta em longas e inventivas letras, mas deixa a desejar em motivos melódicos cíclicos e pouco inspirados. Versos como “Nem tudo que se publica é fato / Nem todo galã das oito é rico / Nem todo camisa 10 é Zico / Nem todo cantor de rock é chato” e “Nem todo maluco é sem juízo / Nem todo grã-fino tem fineza / Nem toda pintura tem beleza / Nem toda beleza é paraíso“ sinalizam a imaginação fértil de um compositor maduro, mas igualmente solto e repleto de frescor em seus traços.

Contando com a participação especial de um dos integrantes do grupo Tira Poeira, o bandolinista Henry Lentino, Krieger sem empenha em levar adiante o samba de roda Clareia, mas o resultado deixa a desejar se comparado aos sambas que o mesmo riscou em seu debute. Também adornada pelo instrumento de um antigo companheiro de Lapa, o violinista Nicolas Krassik, Galileu é outra que, salvo o belíssimo solo final do francês, pouco acrescenta ao repertório melódico de Krieger. Dando sequência à série de participações musicais que recheiam o miolo de Correnteza, o músico apresenta o bolero Sobre as mãos, assinado em parceria com o violonista Zé Paulo Becker e com direito ao trombone de Roberto Silva e o sofisticado piano de João Donato, além da bela A mais bonita de Copacabana, azeitada pela gaita quente de Rildo Hora.

Pouco ousado, Correnteza surpreende apenas pelo inusitado arranjo tecido para Ela entrava, onde a voz de Krieger é embalada pelos “sopros” de um naipe de cinco cuícas sobrepostas, tocadas pelo percussionista Fabiano Salek. E só recolhe a fluidez plantada na faixa inicial ao se deixar levar pela sanfona de Marcelo Caldi no xote Rosa de Açucena, assim como no forró Graziela, disfarçado de canção pop. Encerrado com o samba(anti)exaltação Serpentina, este ciclo de canções repousa em calmaria e deixa clara a urgência de novas, e talvez revoltas, ondulações musicais.

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